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terça-feira, 28 de outubro de 2008

O DIREITO DE SONHAR

Por: Eduardo Galeano

Tente adivinhar como será o mundo depois do ano 2000. Temos apenas uma única certeza: se estivermos vivos, teremos virado gente do século passado. Pior ainda, gente do milênio passado.

Sonhar não faz parte dos trinta direitos humanos que as Nações Unidas proclamaram no final de 1948. Mas, se não fosse por causa do direito de sonhar e pela água que dele jorra, a maior parte dos direitos morreria de sede.

Deliremos, pois, por um instante. O mundo, que hoje está de pernas para o ar, vai ter de novo os pés no chão.

Nas ruas e avenidas, carros vão ser atropelados por cachorros.

O ar será puro, sem o veneno dos canos de descarga, e vai existir apenas a contaminação que emana dos medos humanos e das humanas paixões.

O povo não será guiado pelos carros, nem programado pelo computador, nem comprado pelo supermercado, nem visto pela TV.

A TV vai deixar de ser o mais importante membro da família, para ser tratada como um ferro de passar ou uma máquina de lavar roupas.

Vamos trabalhar para viver, em vez de viver para trabalhar.

Em nenhum país do mundo os jovens vão ser presos por contestar o serviço militar. Serão encarcerados apenas os quiserem se alistar.

Os economistas não chamarão de nível de vida o nível de consumo, nem de qualidade de vida a quantidade de coisas.

Os cozinheiros não vão mais acreditar que as lagostas gostam de ser servidas vivas.

Os historiadores não vão mais acreditar que os países gostem de ser invadidos.

Os políticos não vão mais acreditar que os pobres gostem de encher a barriga de promessas.

O mundo não vai estar mais em guerra contra os pobres, mas contra a pobreza. E a indústria militar não vai ter outra saída senão declarar falência, para sempre.

Ninguém vai morrer de fome, porque não haverá ninguém morrendo de indigestão.

Os meninos de rua não vão ser tratados como se fossem lixo, porque não vão existir meninos de rua.

Os meninos ricos não vão ser tratados como se fossem dinheiro, porque não vão existir meninos ricos.

A educação não vai ser um privilégio de quem pode pagar por ela.

A polícia não vai ser a maldição de quem não pode comprá-la.

Justiça e liberdade, gêmeas siamesas condenadas a viver separadas, vão estar de novo unidas, bem juntinhas, ombro a ombro.

Uma mulher - negra - vai ser presidente do Brasil, e outra - negra - vai ser presidente dos Estados Unidos. Uma mulher indígena vai governar a Guatemala e outra, o Peru.

Na Argentina, as loucas da Praça de Maio vão virar exemplo de sanidade mental, porque se negaram a esquecer, em tempos de amnésia obrigatória.

A Santa Madre Igreja vai corrigir alguns erros das Tábuas de Moisés. O sexto mandamento vai ordenar: "Festejarás o corpo". E o nono, que desconfia do desejo, vai declará-lo sacro.

A Igreja vai ditar ainda um décimo-primeiro mandamento, do qual o Senhor se esqueceu: "Amarás a natureza, da qual fazes parte".

Todos os penitentes vão virar celebrantes, e não vai haver noite que não seja vivida como se fosse a última, nem dia que não seja vivido como se fosse o primeiro.

sábado, 18 de outubro de 2008

A relação da mídia com as siglas partidárias

Falta esclarecimento, mas sobra adulação ao político na hora do voto. Posicionar-se frente aos jogos de poder das siglas partidárias tornou-se um desafio. A sociedade, perdida e desinformada, é uma presa fácil para bajulações, trocas de favores e diversas outras estratégias desprezíveis utilizadas pelos candidatos, na busca afoita em chegar ao poder.

Desde a promulgação da constituinte de 1988, o Brasil passou a contar com uma infinidade de siglas partidárias, as quais representam, ou, pelo menos, "deveriam representar", a diversidade política e ideológica dos projetos existentes para o país.

É histórico esse processo, hoje, naturalizado no cenário nacional. Durante a ditadura militar, por meio da Lei Falcão, surgiu, no Brasil, duas siglas partidárias: a Arena - Aliança Renovadora Nacional - (criada com o objetivo de apoiar o regime) e o MDB - Movimento Democrático Brasileiro - (que fazia oposição ao regime, mas era, até certo ponto, controlada por ele)

Na década de 1980, vários partidos surgiram e outros saíram da clandestinidade, formando, assim, a atual conjuntura político-partidária brasileira. Para o professor de comunicação da PUC - RS, Osvaldo Biz, "ao longo da história do Brasil os partidos nunca tiveram um reconhecimento do público". Fator, esse, determinante para o não reconhecimento e a falta de identificação ideológica entre o candidato e a legenda que ele representa.

Um dos pontos centrais da discussão em torno da Reforma Política diz respeito, justamente, a fidelidade partidária. Os defensores da liberdade de consciência, na qual o político deve agir de acordo com as suas próprias convicções, e pode, dessa forma, entrar e sair de um partido sem necessariamente ser fiel ao programa, demonstra o quão grave se torna o voto destinado ao candidato, ao invés de se privilegiar o partido.

Não são raros os casos de políticos que mudam de uma sigla para outra, com a única intenção de atingir o poder. Essa troca desenfreada de legenda, corrobora com a falácia de que os "políticos são todos iguais". Biz, ressalta a existência de uma pequena legislação a caminho, a qual determina: "se o político mudar de partido, perde o mandato". Para o professor da PUC, grande parte das pessoas não têm consciência da importância do voto ideológico. Segundo ele, há uma relação de pouco apreço aos partidos, "ou, porque eles nascem de cima para baixo e a população não participa de suas formações, ou porque, as idéias giram em torno de um líder, o qual consegue ter ascendência sobre os outros, ou seja, os militantes seguem sem conhecimento do que o partido deseja, o que ele defende e qual é a sua proposta de fato"

"No Brasil ainda não temos partidos que possuam uma proposta clara e lutem para chegar ao poder com a intenção de colocar em prática seus programas. Hoje, são mais de 22 partidos registrados no TRE e as pessoas se perguntam: - o que diferencia um partido de direita para um de esquerda? Ou mesmo dois partidos de esquerda. Tudo isso leva a confusão na mente do eleitor, o que gera essa triste realidade eleitoral", ressalta Biz.

As constatações feitas pelo professor da PUC deixam claro que a mídia não faz uma análise sobre o papel do partido, do que ele representa. "A sociedade é privada das principais informações. É só prestar atenção no enfoque dos veículos de comunicação durante as campanhas eleitorais. O principal, para os "grandes meios de comunicação", é divulgar pesquisas de intenção de voto e mostrar aos espectadores quem está na frente", destaca Biz. Isso é mais uma forma de induzir o eleitor a votar em determinado candidato, excluindo novas possibilidades. A idéia proposta pela imprensa é de que a disputa já está definida. O eleitor poderá "jogar seu voto fora", caso não escolha os que estão a frente do processo.

Para o pesquisador, a mídia poderia fazer um trabalho maravilhoso de esclarecimento. Bastava chamar o eleitor, publicar qual a constituição dos partidos, o que cada um deles defende, a sua legislação, o seu programa. Atualmente, são 527 jornais no Brasil, com tiragem total de 7 milhões de exemplares. Segundo uma regra utilizada nas faculdades de comunicação, são cerca de 4 leitores para cada um dos jornais publicados. Portanto, são 28 milhões de pessoas que lêem jornais. "Mas, e os outros 150 milhões?", indaga.

Sem conhecer nada do partido, os votos acabam sendo concedidos pela amizade estabelecida com o candidato, ou, então, porque o aspirante ao cargo negocia votos em troca de benécies. Isso, além de ser ilegal, é uma lástima para a democracia. Ganha quem chegar mais rápido no potencial eleitor, for capaz de conseguir mais aliados e se tratar de um exímio negociante. Infelizmente, estas estratégias nada têm a ver com a capacidade de governar para todos, por todos e com todos.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

E não é que a chama teima em não se apagar?

Revolucionar a si mesmo, dia-a-dia, sem tombar diante das adversidades, visando construir uma sociedade livre e igualitária. Eis o desafio que se apresenta aos militantes das causas sociais.

Em tempo, cabe lembrar de um cara que andou pela América Latina há mais de quatro décadas. Ele jamais se deixou abater diante das dificuldades e não se submeteu a um cargo burocrático, após, junto de seu companheiro de luta, Fidel Castro, ter derrubado o governo ditatorial de Fugêncio Batista, em Cuba. Trata-se de Ernesto Che Guevara.



"Muitos dirão que sou aventureiro, eu sou de fato, só que de um tipo diferente, daqueles que entregam a pele para demonstrar suas verdades", disse Che Guevara antes de partir para sua última trincheira de luta.

Que legado terá deixado Che, após 41 anos de seu assassinato nas selvas da Bolívia?

Estava movido por uma ânsia de liberdade. Sentimento que deveria acompanhar todo aquele que se diz revolucionário. Muitos ainda acreditam que Che vive, outros, dão-lhe como um morto capaz de ressurgir apenas através da indústria da cultura, estampado em camisetas e pôsters.

Certamente ele ainda vive. Está presente em sentimentos altruístas, na busca de justiça e igualdade social. Vive muito mais em olhares que sobrevoam as místicas instâncias de poder, do que nos conchavos espúrios, responsáveis por desestimular a militância, consagrando os adversários como aliados. No Brasil, a chamada esquerda, expressa em partidos por hora governistas, parece ter tomado uma ducha de água fria. Não obstante, a chama capaz de inflamar os corações e as mentes dos inconformados segue acesa. Altiva e firme, como o guerrilheiro, que, diante de seu algóz, não hesitou. Viva ela está, e, viva ela estará, por meio das organizações sociais, dos movimentos libertários e das lutas diárias de camponeses, índios, negros, mulheres e trabalhadores.

Feridos? Talvez. Mortos? Jamais!

Como desistir da utopia diante de tamanha injustiça social? De tamanha exploração dos povos latino-americanos. Movimentos polítcos que estão surgindo em toda a América Latina, finalmente, parecem contrapor-se, mesmo que pela via institucional, ao modelo de subserviência historicamente imposto pelos EUA. Países como Brasil, Argenteina, Uruguai, Equador, Chile, Venezuela e Bolívia não são os mesmos de 40 anos atrás. No entanto, ainda clamam por uma organização popular que privilegie a base.

O socialismo nunca esteve tão presente, ou, pelo menos, suas interpretações e conseqüentes políticas sociais nunca foram tão urgentes, como nos dias de hoje. Embora sejam poucos os que, realmente, desejam construir alternativas ao modelo neoliberal, por intermédio dos governos legalmente constituídos.

Nem todos conseguem deixar as vaidades e a disputa por espaços políticos de lado. Deixar de assumir a posição confortável de burocrata, em meio à governabilidade, para lançar-se à "selva" capitalista, procurando minar as estruturas de poder. Como outrora o fez Che Guevara.

Mesmo assim, após 41 anos, a chama teima em acender. Embora a maioria acredite que ela não possui mais forças para queimar. Talvez, estes mesmos, sejam os que dela se aqueceram em outras épocas, mas, hoje, preferem apenas referendá-la através do discurso fácil, quando objetivam promover seus projetos pessoais. Há tempos deixaram de ser agentes da transformação social, viraram meros burocratas subservientes ao poder do capital financeiro. Os revolucionários de bol$o, ou, de oca$ião, também podem ser caracterizados como "revolucionários de garganta". Afinal, nem todos estão dispostos a entregar a sua vida pela liberdade de qualquer um dos países da América Latina, sem pedir nada a ninguém.


Ainda há os que tremem de indignação sempre que se comete uma injustiça no mundo, companheiro.

Hasta la vitória, siempre!

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