O Exílio Midiático está licenciado pelo Creative Commons

Todos os posts disponíveis neste espaço podem ser reproduzidos em outros blogs e sites, sendo necessário citar apenas o autor dos textos (Eduardo Silveira de Menezes) e a fonte (Exílio Midiático). Por outro lado, não é permitido o uso comercial das obras aqui expostas. Mais detalhes ao final da página, clicando no link disponível.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Sobre déspotas, democratas e a mídia

A mídia não cansa de criar "heróis" e condenar "tiranos", mesmo que não haja tais personagens ou que eles estejam em posições opostas aquelas denunciadas a priori. Às vezes a distorção dos fatos é tão grande que nas rodas de conversa, pelas ruas, encontramos pessoas, de todas as idades e das mais variadas classes sociais, concordando umas com as outras sobre alguma opinião que ouviram na TV, ou leram naquela revista que tem na sua prática cotidiana o antônimo do que pressupõe seu nome. Na “Veja”, ao invés de compreender determinado fato, o leitor acaba sendo induzido a fazer parte de um ritual maniqueísta que cria factóides e distorce a realidade para atender os interesses políticos e comerciais da Editora Abril.

Quando, em pleno século XXI, um presidente latino-americano, eleito pelo voto popular, é deposto de seu cargo e os meios de comunicação chamam isso de “crise política”, ou, em alguns casos, admitem ser um golpe, mas afirmam se tratar de uma defesa do que regulamenta a Constituição do país, é necessário fazer uma reflexão antes de sair reproduzindo qualquer coisa por aí.

Após depor o presidente Manoel Zelaya, com a justificativa de que, ao propor um terceiro mandato ele estaria atentando contra a democracia, o golpista, Roberto Micheletti, fechou os canais de televisão e as emissoras de rádio que se opunham a sua prática despótica.

Além disso, Micheletti, chamado de "presidente interino" pela mídia traiçoeira, embora esteja mais para ditador interino, regozija-se de estar restringindo a liberdade de expressão em Honduras para defender o que está na Constituição. A maioria dos hondurenhos quer um terceiro mandato do presidente Manuel Zelaya, mas as forças conservadoras conspiram contra a democracia e, por incrível que pareça, dizem agir em nome dela.

Como se isso não bastasse, a opinião pública mundial é obrigada a reconhecer que ao lado da União Européia destaca-se o presidente norte-americano, Barack Obama, como símbolo de defesa da democracia no país caribenho. Obama condena o golpe militar em Honduras, mas nada fala sobre as três bases militares que os Estados Unidos mantém na Colômbia, sob o pretexto de combater o narcotráfico.

Assim como Hugo Chaves sofreu, e ainda sofre, diversas retaliações e perseguições políticas mesmo sendo submetido a uma série de referendos, após garantir a eleição ilimitada, agora é a vez de Zelaya fazer parte do rol de presidentes latino-americanos que estão enfrentando uma "crise política".

Numa rápida análise, digna das matérias mais utilizadas na mídia nacional, cabem aqui, duas questões: o que têm em comum Venezuela e Honduras? Não por acaso, são dois grandes produtores de petróleo. Seria isso, aliado a descoberta do pré-sal no Brasil, um indicativo de alguma ação militar em terras da América do Sul? Só o desfecho dos fatos irá responder a essa pergunta, no entanto o presidente Lula já tomou sua posição, manteve-se ao lado de Zelaya, condenando as forças golpistas, o que é um ótimo indicativo.

Com quantos mandatos se faz uma democracia?

Essas discussões sobre ter um, dois, três, quatro, ... vinte mandatos, ou permitir apenas uma reeleição, não atingem a discussão mais de fundo. Se trocar de presidente a cada dois, quatro ou oito anos, desse ao país um caráter mais democrático, não apenas no plano das idéias, mas também na prática, seria dever de cada cidadão defender tal situação, mas mudar de governo por mudar ou “porque já teve tempo suficiente e não fez”, etc.. é jogar no lixo da história o passado de espólio sobre as riquezas naturais dos povos da América Latina, que não pode ser reconstituído em tão pouco tempo.

É justamente a soberania popular e os direitos civis que estão em jogo. Havendo a aprovação de um projeto político capaz de se opor minimamente a esta pseudo-democracia - democracia-liberal - já será um avanço para diminuir a situação de miséria e desigualdade social profunda que os países latino-americanos estão submetidos desde a época das primeiras expedições européias em nossos solos.

Com o tempo a democracia ianque assumiu a colônia escrava e se revelou um verdadeiro câncer social. Os países menos desenvolvidos inspiram-se, através dos meios de comunicação, numa forma equivocada de enxergar o mundo e simplificam esta disputa entre o bem e o mal, o avanço e o retrocesso...

Especialistas de plantão

Quando Hugo Chaves fala da ofensiva norte-americana na América Latina, os "especialistas de bunda quadrada", dizem que são retóricas vazias. Esses caras estão sentados na suas poltronas confortáveis e falam através da televisão para milhares de pessoas.

São especialistas que "nádega", ou melhor, nada teriam a perder se levantassem um pouco a bunda da cadeira e saíssem dos estúdios para olhar a realidade do povo brasileiro e latino-americano pela lente mais precisa de todas, a visão humana, capaz de enxergar a realidade sem meias verdades.

Graças às políticas defendidas pelos próceres da democracia representativa e comunicacional a população tem sido constantemente dizimada pela miséria sem que isso, se quer, vire notícia; um sintoma da manipulação midiática, capaz de transformar golpista em "presidente interino" e golpe militar em "governo de fato".

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Com a palavra o poeta...

O poeta português Fernando Pessoa dizia sentir o dever pessoal de promover o alargamento da consciência humana.

Em sua obra, nos convida a refletir sobre o idealismo e propõe a utilização de métodos simples para encontrarmos as respostas aos nossos problemas pessoais.

Fica aqui, dois fragmentos de sua vasta obra literária, cujos sentidos se sobrepõem a qualquer outra postagem que me tenha passado pela cabeça no dia de hoje. Pretendo chamar a atenção para a importância do que suas palavras revelam.

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos".

Sossega, coração! Não desesperes!

Sossega, coração! Não desesperes!
Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.

Mas pobre sonho o que só quer não tê-lo!
Pobre esperença a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!

Sossega, coração, contudo! Dorme!
O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme,
A grande, universal, solente pausa
Antes que tudo em tudo se transforme.

Fernando Pessoa, 2-8-1933.

domingo, 20 de setembro de 2009

Um réquiem ao tradicionalismo neste 20 de setembro

Quando, em 1835, estancieiros e charqueadores gaúchos se colocaram contra o Império, não estavam tomados por sentimentos de resistência, afirmação ou patriotismo. O que estava em jogo eram, exclusivamente, os interesses políticos e econômicos.

Sendo assim, não foi a totalidade da população do Rio Grande do Sul que se levantou contra o Império. Na verdade, a maior parte dos gaúchos o apoiava. Com isso, os representantes da oligarquia riograndense, se viram obrigados a construir um movimento contra a taxação da terra e do charque; estavam imbuídos de interesses pessoais e preocupados com a sua própria condição financeira.

Esta data, comemorada pela população, ano após ano, com bastante entusiasmo, não passa de uma reverência ao que foi escrito pelos assessores dos Chefes Militares. Baseados no legado deixado pela Revolução Francesa, os escribas da época, pintaram um quadro de revolução patriótica, no entanto, a história revela que foi apenas um levante patrocinado, em sua maioria, pelos proprietários de terra. Um movimento que nada tinha a ver com ideais revolucionários quando saía do papel e chocava-se com o contexto histórico.

Aliado a isso, preocupa, ainda hoje, os incentivos dados pelo governo para promover desfiles, festas e rodeios. Isso mostra que não existe o mesmo interesse em investir na educação, por exemplo. Priorizar o aprendizado, é dar conhecimento ao sujeito sobre a sua história e deixar que ele julgue os fatos por si mesmo. A população fica refém de um tradicionalismo maniqueísta, que busca na distorção histórica dos fatos, a afirmação de seu movimento.

Revolução de quem?

Esse tradicionalismo, travestido de civismo, é um produto da sociedade em que vivemos. A espetacularização dos fatos, a construção dos mitos e os próprios esteriótipos e preconceitos impregnados na sociedade contempôranea, têm suas raízes fincadas nesse modo de enxergar o que é "ser" gaúcho.

Mais uma vez foram os negros que sangraram. Para se ter uma ideia, os farrapos, não só mantiveram a escravidão, como também entregaram para o Império os negros que haviam sobrevivido a chacina de Porongos.

Ao fechar o acordo final e aceitar a anistia oferecida pelo Barão de Caxias, os negros, que ainda restavam no exército farroupilha, foram levados para trabalhar nas galés do Rio de Janeiro como escravos.

Com a palavra o Historiador

Segundo o historiador da Universidade de Passo Fundo, Tau Golin, "a formação da memória é altamente manipulada". Ele conta que essa exaltação toda, alimenta um sentimento de arrogância e antibrasileiro, ou seja, não contribui, em nada, na compreensão da grandeza histórica do Rio Grande do Sul. É uma percepção que transforma o estado num mito de uma república de estancieiros e senhores de escravos.

Para Golin,"o que vemos hoje é um estado mobilizado pelas forças da Indústria Cultural e pelos aparelhos ideológicos do governo, com o intuito de cultuar na avenida e, por toda a mídia, senhores de escravos e caudilhos, como heróis".

O historiador coloca a situação da seguinte forma: "o modelo está pronto, basta querer parecer do sul e vestir a fantasia. Como isso não tem materialidade, nem ambiência social, envereda-se, para a teatralidade". A verdadeira identidade regional está alicerçada na diversidade cultural presente em todas as regiões, não só, no Rio Grande do Sul, mas também, Brasil afora.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Zé do Né

É verdade que existem os azarados, os de má sorte, aqueles que desmentem ditados como: “um raio não cai duas vezes no mesmo lugar” ou “nada como um dia após o outro...”

O cara comprova que o raio, não só, cai mais de umas mil vezes no mesmo lugar, como machuca, e muito. E se dói, imagina como vai ser um dia após o outro...

O camarada só se quebra. Parece que está eternamente preso a uma pegadinha do destino e tem alguém, ou, “alguéns” dando risada da sua cara. Pois bem, nada se compara a triste sina de um grande amigo meu, o langoroso Zé do Né.

Nunca tinha visto tanto infortúnio reunido em uma só pessoa. O pior de tudo é que o rapaz sempre foi exemplo de aplicação e responsabilidade. Quando questionado sobre diversão, dizia:

- Acho importante a gente se distrair, aproveitar a vida, mas antes...
A partir daí vinha uma série de explicações para mostrar que, em primeiro lugar, estavam sempre os afazeres profissionais, acadêmicos ou domésticos.

Aos poucos Zé do Né foi percebendo que não teria muito futuro assim. Tudo em sua volta era um fardo. A cada dia sentia sua cabeça pesando mais de uma tonelada. O resultado disso tudo é que, na maioria das vezes, ou melhor, sempre, Zé do Né se dava mal.

Não podia ser diferente. Zé queria tudo tão perfeito, tão pontual e tão correto. Não tinha como atender nem as suas próprias expectativas, o que dirá as dos outros. O mais engraçado é que as pessoas que o cercavam nem se preocupavam tanto assim com ele. Aliás, o Zé se preocupava com os outros, pelos outros e para os outros. Estranho “né”? Vou tentar explicar...

Zé do Né tinha emprego, era casado e estudava. Todo dia ele ficava inquieto, na ânsia de corresponder às mais diversas expectativas. Mal sabia que a principal expectativa a ser atendida era a cobrança excessiva sobre si mesmo. Ele sempre ouvia:

-Zé, já está tudo certo para fecharmos aquele negócio no prazo estabelecido?
-Zezinho, meu bem, desce o lixo, paga as contas... não esquece, viu? Te amo.
-Devia ter estudado mais rapaz. Sua nota deixou a desejar.

Eram tantas cobranças. Zé do Né ficava atordoado na hora de responder aos questionamentos. Logo demonstrava claramente a sua insegurança. Não conseguia dizer nada sem questionar o interlocutor com um duvidoso “né”, ao final de cada afirmação.

-Sim chefe, está tudo organizado e estamos dentro do prazo. "Né”?,
-Tá certo. Sou eu que faço tudo nessa casa mesmo. "Né”?
-Pois é, “né”? O senhor tem razão professor. Não estudei tanto quanto poderia ter estudado. Posso render muito mais, “né”?

Pobre Zé do Né, mal sabia ele que a vida, ah... a vida..., não está nem aí se o Zé fechou aquele negócio no trabalho, se desceu o lixo, lavou a louça ou se estudou para prova.

O que ela quer mesmo é fazer o Zé perceber que não importa o quanto se preocupe, ou tente fazer as coisas o mais perfeito possível, nunca estará um passo a frente. Nem poderá prevê-la.

É nessas horas que Zé do Né costuma se dar por vencido. Ele não consegue perceber que o melhor da vida é justamente não ter certeza de nada e ser pego de surpresa a cada novo instante. É viver cada dia ao seu dia.

Enquanto isso, segue a expectativa de que, o Zé, aprenda a conviver com a dúvida. Esta sim, componente essencial para ser feliz. Né?

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Está ao alcance das nossas mãos

Já faz algum tempo que tirei essa foto. Como todas as coisas surpreendentes da vida, a capturei totalmente por acaso. Isso para não dizer que foi realmente de forma acidental. De uns tantos cliques que dei, apenas um saiu revelando alguma coisa.

Caminhando pela praça Coronel Pedro Osório, em Pelotas, com uma máquina que me havia sido emprestada, em punho, tinha como único objetivo sair clicando o que viesse pela frente. Era uma simples distração.

Quando visualizei as imagens capturadas pela lente da câmera percebi que, em uma delas, havia encontrado um sentimento esquecido em toda parte. É a tal da solidariedade.

Por algum tempo fiquei me perguntando o real significado desta foto. Será que precisa ter um significado? Será apenas um? Na verdade, para mim, o acaso não é totalmente desprovido de intenção.

Não que eu quisesse tirar a foto tal e qual ela aí está exposta, mas acredito na capacidade de, inconscientemente, interagirmos com as nossas emoções e, de alguma forma, colocarmos isso para fora sem que, nem mesmo nós, possamos saber o porquê. Até que alguma coisa nos remete a esse fato.

Heróis de infância - Parte 2

(Continuação...) Sentado à mesa sentia-me um ser de outro mundo. A cada brinquedo que surgia, em meio aos dedos afoitos de meus colegas, percebia que meu lugar não era ali.

Ainda mais quando surgiam os tais “Comandos em Ação”. Empunhados, um a um, pelos meus companheiros de mesa. Era sempre a mesma rotina ao final das aulas. Os bonecos simbolizavam os “heróis” do nosso mundo. Trajados com uniformes militares ou com roupas especiais, estavam prontos para a guerra. Mas eu não.

Traziam o escudo dos EUA no peito e uma águia tatuada no braço. Podiam tudo aqueles brinquedos aos meus olhos de criança. O portador de tais bonecos era como um “Deus”, alguém superior, que podia manipulá-los, fazê-los ganhar vida. Para isso, só precisaria comprá-los. O que não era tão simples assim para algumas crianças...

Eu estudava em escola particular, mas com muito esforço por parte dos meus pais. Éramos três lá em casa, o que deixava o orçamento ainda mais pesado. Nossos pais tentavam nos convencer de que, o fato de estarmos recebendo aquela educação, segundo eles, de “melhor qualidade”, já seria motivo de orgulho e sinal de um futuro promissor. Eu era muito jovem e não fazia o menor juízo sobre essas coisas.

Um dia, contudo, recebi uma lição de verdade naquela escola. A rotina, como descrevi, era sempre a mesma. Final de aula, todos pegando seus brinquedos para começar mais um ritual de comparações e concorrências do qual eu não participava, ou, pelo menos, não até certo dia.

No final de semana, meio sem querer, não é que eu havia achado na rua o tal do boneco? Isso mesmo. Era um “Comando em Ação”. De inicio achei apenas uma perna, andei mais alguns passos e lá estava o resto do corpo.

Lembro-me como se fosse ontem, meu pai colando a perna do meu mais novo “herói”. Ele estava sujo, pois o encontrei na areia da praia. As cores do uniforme de soldado estavam desbotadas e, ao contrário daqueles que eu costumava ver na escola, não tinha nada de especial.

Bem, mesmo assim resolvi levá-lo para aula no dia seguinte. Era o que eu tinha de melhor. Aliás, era o único que eu tinha. Antes de retirá-lo da mochila hesitei, mas logo aquele momento de dúvida deu espaço a uma excitação sobre o novo.

A possibilidade de, enfim, ser incluído no grupo sentado comigo à mesa era mais forte do que o medo. Arrisquei. Quando puxei o “Comando em Ação” da mochila meus colegas nem deram atenção. Como já estava acostumado, também resolvi ignorá-los.


De repente, alguém exclamou:

- Olhem. O boneco dele é de verdade!
-Ele deve ter vindo de uma guerra - disse o outro.
-Sim! Está como um verdadeiro soldado: sujo e com a perna quebrada - completou um terceiro.

Todos largaram seus brinquedos, mais bonitos e novos do que o meu, para conhecer o que eles identificavam como um "Comando em Ação de verdade". Aquele boneco salvou o meu dia.

Ele conseguiu ser um verdadeiro herói naquele momento - era tudo que eu podia compreender. O problema é ter de arranjar um igual todos os dias. Para minha tristeza a novidade acabou tão logo tocou a sirene da escola.

Essa é a lógica da sociedade de consumo. Não poupa nem mesmo as crianças. Se apresenta desde a mais tenra infância. A lição que se pode tirar de acontecimentos como esse é individual, mas o resultado será sempre coletivo.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O texto: expressão da realidade?

Desde Aristóteles, quando se inferiu à literatura um caráter mimético, a arte de escrever já ocupava um lugar de destaque nas rodas de conversação da antiga Grécia. Esse ofício, ainda repercute, com maior ou menor intensidade, na sociedade contemporânea. Depende do grau de interesse de cada um.

Com o passar do tempo, surgiram estudos de importantes pensadores na área da literatura. É o caso do britânico Terry Eagleton, crítico literário marxista, que definiu a Teoria Literária como uma forma teórica de investigação. Ele procurou trabalhar com o conceito de literatura, partindo do tipo de relação que ela estabelece com a sociedade.

A palavra “novel” (de novo ou inexperiente) foi usada nos séc. XVI e XVII tanto para definir os acontecimentos reais, quanto os fictícios. Os romances e as notícias não eram claramente factuais, a distinção que é feita hoje não se aplicava na época. Dessa discussão, surgiu a ideia de que a literatura, talvez não seja definida pelo seu caráter ficcional ou imaginativo e sim, por aplicar uma linguagem particular.

E por que não observar o jornalismo por esse mesmo ângulo? Quanto existe de ficção nas notícias selecionadas todos os dias por algum chefe de redação e editadas dezenas de vezes antes de chegarem ao público leitor?

Não se pode afirmar que a notícia é o retrato fiel do fato noticiado, ela pode, no máximo, revelar uma ideia geral sobre algo que já aconteceu. Isso, por si só, já nos leva a estabelecer essa relação entre a criação da obra literária e do texto jornalístico, levando em conta todas as variáveis que envolvem a construção textual em ambos os casos.

Tanto no texto jornalístico, quanto no literário, a experiência sobre o assunto, o contexto, os preconceitos do redator/escritor, as imposições da empresa para qual trabalha, a formação de esteriótipos e a mistificação de que ele (redador/escritor) é um ser capaz de levar a verdade, o novo e o inusitado ao restante da população, influem na maneira com a qual será escrita e recebida aquela versão da realidade.

Essa comparação entre o resultado final do que é considerado obra literária ou jornalística, remete a discussões antigas sobre a capacidade do texto, seja ele qual for, absorver as angústias da sociedade e promover a cidadania, levando a todos um retrato, que, se não pode ser exato, pelo menos seja produzido dentro do espectro onde se dá o fato ou se cria a realidade.

O que pretendo questionar com tudo isso é o caráter de verossimilhança que a notícia, enquanto obra literária, adquiriu na sociedade contemporânea. Na maioria das vezes, não há o espaço para a dúvida e o questionamento. Fator esse, que, na minha opinião, é extremamente lesivo à sociedade.

A insistência de muitos veículos de comunicação em afastar a subjetividade das matérias jornalísticas, aliada a falta de sustentação histórica dos fatos, induz o leitor ao erro. Sendo este fantasiado, diariamente, de verdade absoluta e aquele, de intérprete da realidade.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Um diálogo

Essa deu no blog do jornalista e escritor Georges Bourdoukan, ele flagrou dois burros conversando...

Dois burros conversavam quando um perguntou ao outro:
- Imagina você que quando um humano quer ofender a outro humano o acusa de burro. Por que será?
- Não tenho a mínima idéia.
- Quando será que isso começou?
- E quem sabe?
- Realmente é estranho isso...Humano chamar o outro de burro como ofensa.
- Talvez porque chamá-lo de humano fosse ofensa maior.
- Você acha?
- Claro! Você já viu algum burro explorar outro burro?
- Não.
- Você já viu algum burro oprimindo outro burro?
- Não.
- Você já viu algum burro abandonar a cria?
- Não.
- Você já viu algum burro sem teto?
- Não.
- Você já viu algum burro sem terra?
- Não.
- Você já viu algum burro torturando outro burro?
- Não.
- Você já viu algum burro declarando guerra a outro burro?
- Não.
- Você já viu algum burro invadindo o país de outro burro?
- Não.
- Você já viu algum burro matando ou morrendo em nome de Deus?
- Não.
- Então, qual ofensa é maior, chamar de burro ou de humano?

domingo, 13 de setembro de 2009

*Numa nota só

Não ouço você, não escuto nada.
A cada nota calada, estrofe e melodia silenciada.
As músicas não costumam escapar-me da mente.
Dificilmente uma nota mente.

Se mente, é porque desafinada ela está.
Não é culpa do texto a canção não encaixar.
Estrofes e cifras devem combinar.
Se isso ocorrer, se forma o par.

A música, soberba, debocha do texto.
A escrita e o texto é só um pretexto.
O canto é encanto, num canto qualquer.
O texto é o homem; a música, a mulher.

Momentos efêmeros se tornam canção.
Qualquer instante da vida é único então.
O livro, velho e rabugento, cismando ensinar,
saiu com a música para namorar.

Os dois se encontraram em um carnaval.
Fizeram da lírica o ato final.
O amor que nasceu então floresceu.
O sexo das letras foi em sons que se deu.

Orgasmos melodiosos passaram a entoar.
O texto e a música dispostos a amar.
Nem sempre é tão simples seguir a canção.
É bom se entregar à composição.

*O texto está em C#- e foi escrito num dia qualquer, ouvindo um livro a todo pau e lendo uma boa música!

sábado, 12 de setembro de 2009

*Heróis de infância - Parte 1

Lá estava eu, sentado naquela mesa redonda e cercado pelos meus colegas da pré-escola. Todo final de aula era a mesma coisa. A professora dizia: - peguem seus brinquedos e aproveitem para conversar baixinho. Mas não façam bagunça!

Fazíamos isso enquanto esperávamos os nossos pais virem nos buscar. Não podíamos sair da mesa onde estávamos até a chegada do responsável. Uma tortura interminável, fruto de uma educação rígida e pretensiosa.

Aquele colégio me dava arrepios. A sala era fria e enorme. Fazia eu me sentir sozinho, dava medo de verdade. Era toda branca, com mesas redondas uma ao lado da outra. A tampa das mesas era verde, combinando com o assento das cadeiras. Havia, ainda, um armário grande, com desenhos que fazíamos colados por toda sua extensão.

O alfabeto ficava pendurado numa espécie de "varal". Ele atravessava de ponta a ponta a sala de aula. Em cada uma das folhas presas à corda havia o desenho de um animal, onde estava grafada a letra correspondente para facilitar a sua identificação.

Um exemplo claro desse "aprendizado por assimilação simbólica" pode ser dado pela letra “A”. Encontrava-se escrito, logo abaixo, a palavra" águia”. Era a mais altiva de todas. Afinal de contas, é a primeira letra do alfabeto e, por isso, encontrava-se em destaque. Ela ficava estampada como um cartão de visitas. O símbolo oficial dos Estados Unidos ganhava evidência em um ambiente repleto de crianças, todas ansiosas por aprender coisas novas e dar significado as suas vidas.

Um método educacional capaz de inserir no imaginário dos pequenos a importância e a grandeza daquele animal e, consequentemente, de tudo aquilo que ele representava. De início, era só isso. Mais tarde formaríamos frases inteiras. Daríamos sentido as relações estabelecias naquele espaço de convivência. Assim, aprenderíamos lições para toda a vida. (Continua....)

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

De volta ao Exílio

Existe uma confusão muito grande quando se fala em exílio. Para alguns, mais desavisados, exilar-se é um ato de covardia, mesmo dadas às circunstâncias e, até mesmo, a falta de opção.

Um engano que surge, talvez, porque aqueles que atribuem aos exilados tal juízo de valor, têm pouco conhecimento de mundo, de história e sofrem de crises contemporâneas ridículas, como aquela necessidade de mostrar conhecimento, mesmo por meio de uma retórica vazia. Problema esse que está intimamente ligado a crises histéricas de auto-afirmação.

Para outros, porém, o exílio serviu, e ainda serve, como um recuo estratégico. A história dá claros exemplos da importância desse que, para mim, é, sem dúvida nenhuma, uma oportunidade de estabelecer um contato íntimo com a mais profunda capacidade de perceber o que está acontecendo a nossa volta e, dessa forma, projetar o que será feito logo ali adiante.

Eu poderia citar diversos exemplos de figuras importantes que buscaram no exílio as suas forças e fontes de inspiração para enriquecerem a arte, a música e a política. Na verdade, não faltarão oportunidades para que eu faça isso neste blog.

O Exílio Midiático está retornando e com ele política, cultura, sociedade e literatura. Não julgo dominar todas estas áreas de conhecimento e nem pretendo, apenas vou aventurar-me por elas. Como sugiro que o faça aquele que, por um motivo ou outro, aqui chegou e leu este post. Até breve!

As mais lidas durante a passagem pelo Exílio

Faça sua pesquisa no blog

Licença Creative Commons
A obra Exílio Midiático de Eduardo Silveira de Menezes foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição - Uso Não Comercial - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não Adaptada. Com base na obra disponível em exiliomidiatico.blogspot.com.. Podem estar disponíveis permissões adicionais ao âmbito desta licença em http://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/2.5/br/.